Um negócio é a materialização da oferta de um produto ou de um serviço que tem valor. Caso perdure no decorrer das gerações, trata-se de algo que se provou digno de ser reconhecido no passado… e que se mantém merecedor de tal credibilidade. O espumante Veuve Clicquot é um belíssimo caso de estudo e o filme em cartaz inspirado na sua história oferece muito a pensar… ( contém spoilers a seguir).
É Barbe- Nicole, a viúva Clicquot a responsável por conquistar o posicionamento singular da marca: a safra “cometa” – famosa por caracterizar o êxito da marca ( ainda no século XIX) é a combinação de vários elementos ( e de várias decisões difíceis – como toda liderança se vê interpelada a conduzir): a alquimia no processo ( resultado de um incansável processo de experimentação); a escolha pela excelência de todos os insumos ( como vidros de boa qualidade); a definição de diretrizes diferentes para o plantio das uvas; a afirmação da sua legitimidade como autoridade competente; e… não menos importante – as desafiadoras negociações com seu (ex) sogro – cético de que Barbe- Nicole teria condições de prosperar. A conjuntura do momento também era assustadora – dado o contexto das guerras Napoleônicas.
Todo membro de uma nova geração de uma família empresária que tem um papel de liderança no grupo precisa provar que tem aptidão, fôlego e maturidade para exercer seu papel. Por isso convém que seja abastecido de muitos estímulos que ajudem neste processo de desenvolvimento e de capacidade de auto-crítica. Barbe-Nicole erra: perde lotes de produtos por não levar em conta a variável do calor no seu projeto de exportação. Aprende com o erro e arca com as consequências – passa a vender bens pessoais para zelar com o compromisso de pagar o trabalho dos funcionários e ser merecedora de uma segunda chance por parte dos seus sócios – membros da família do seu finado marido. O filme também ilumina uma dimensão de gênero – se é difícil para qualquer jovem de uma família empresária conquistar sua legitimidade como competente profissional – isto seria ainda mais difícil para uma mulher do que para um homem? A pergunta fica em aberto. Podemos argumentar que o filme retrata um passado muito longínquo. No entanto, sabemos que as marcas do passado incidem no presente – talvez de formas mais sutis… Sabemos também que cada caso é um caso e que descrições ” chapadas” ou ” generalistas” não nos ajudam. Tampouco ajuda perdermos de vista estruturas históricas presentes no tecido social: o patriarcado é uma delas.
O filme apresenta interessantes dilemas acerca do estilo de liderança conveniente. Barbe-Nicole busca engajar a sua equipe com a imagem de uma ” roda” na qual todos contribuem, são ouvidos e considerados igualmente capazes de oferecer as boas ideias para o negócio. Tal modelo é questionado uma vez que colocaria em xeque a lógica de uma rígida hierarquia capaz de oferecer segurança e previsibilidade. É comum a tentação de buscar uma resposta quando enfrenta-se um impasse: o filme é feliz ao iluminar a encruzilhada sem recorrer à respostas simplistas – Barbe é capaz de oscilar entre uma forma e outra e este talvez seja um atributo de sua sabedoria gerencial: ser camaleoa multifacetada que lança mão do que é preciso a depender das circunstâncias: firmeza, doçura, convicção, dúvida…
O espumante Veuve Clicquot segue estrelado até os dias de hoje.
Foto destaque: Foto divulgação
Héctor Lisondo
O Instituto Lisondo é uma Consultoria Boutique fundada em 1998 com o propósito de promover o desenvolvimento de pessoas e empresas através de propostas customizadas e bifocais (aspectos técnicos e humanos simultaneamente abordados).
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